Beija-me. Meus lábios secaram.

terça-feira, janeiro 10, 2017


 
@photobyMarleneBarreto

Os meu pés acariciavam a areia húmida e fria, faziam uma espécie de movimento circular repetido. Rodavam ora mais lentamente, ora com um ritmo mais acelerado como se personificassem a linha da minha impaciência.
Olho à minha volta e vejo vários casais de mãos dadas que passeiam à beira-mar, o que faz com que os meus lábios risquem um sorriso.

“Sobre o que falarão eles?”, interrogo-me.
Um dos casais gesticula muito como se estivesse a resolver algo entre eles… o ser humano está sempre resolvendo coisas.
Lá ao longe vejo um pai tentando ajudar a filha (parece-me uma menina) a molhar as suas mãos no mar. Está com medo das ondas e como adulto que protege a sua cria, o pai garante que nada de mal lhe acontece. 


"Que lindo está o mar! Tem aquela cor de prata que tanto gostas", penso.

 “ Porque não vens ver?! Vais gostar.”, continuo.

O seu brilho ofusca-me quando tento olhar para a linha do horizonte.
Não sei se vens. És imprevisível, tanto quanto o mar que por vezes ondula calmo, como outras leva tudo à frente. Espero que a tua imprevisibilidade se decida pelo “sim”. É certo que não temos encontro marcado, não existe hora combinada nem tão pouco te falei do local… enfim, sem compromissos. Tu também nunca foste de te comprometer. Vem, apenas se quiseres. (Mas quero muito que venhas).
O meu sossego é invadido pela excitação de um cachorro que se atira a mim, enchendo-me de areia. Está tão alegre que o abraço, como forma de lhe agradecer o carinho. Os cães têm algo em comum com os humanos, acalmam-se com uma demonstração de carinho e afeto com a diferença que eles não têm dificuldade em admiti-lo, já o ser humano sente na fragilidade e na sensibilidade a sua “ zona não confortável”.

“Beija-me. Meus lábios secaram. Estou à tua espera, entendes isso?”

O beijo vai aproximar-nos, jamais nos afastará. O beijo embora nos torne frágeis, injeta-nos segurança.
O que mais gosto não é do beijo mas do ato de beijar. Das sequências algébricas do corpo até ao momento do beijo. Beijar é um ritual que vai do toque das mão que se acariciam à união dos lábios. As mãos sobem ao rosto com ternura e sentem cada linha da face. Os dedos sublinham os olhos fechados, delineiam o nariz, pressionam as maçãs do rosto e tocam de leve nos lábios, primeiro o inferior depois, o superior. Os olhos abrem e sorriem como se se espelhassem. Os lábios ainda nem se tocaram e o corpo já viveu uma viagem. Com um leve sorriso no rosto, o seu encostar é ávido de desejo, de ternura, de saudade. As bocas trabalham na rotação certa, as línguas encontram-se como almas e as mãos acompanham a equação.
E é desta forma que o meu raciocínio sobre a arte de beijar é interrompindo por alguém que me tapa os olhos .

“Não precisas de falar , conheço-te o cheiro, já de outras vidas”, digo sorrindo. 

 Abraças-me forte e sentaste-te ao meu lado a contemplar o mar.

“Tem a cor da prata”, dizes-me

“Sim, tal como gostas”. confirmei.

A tua mão foi chegando-se à minha meio envergonhada. Sinto um arrepio e encosto o meu rosto no teu ombro.

“Como sabias que estava aqui?”, perguntei.

“Recebi a tua mensagem”, disseste.

“Pensei que Ele não ta desse”, disse. 

“Com a intensidade da tua alma, ELE jamais impediria este encontro".

E assim ficámos por horas a contemplar-nos, recriando o momento mais perfeito da eternidade. Beijaste-me com todo o ritual , com todas as formas geométricas exigidas num momento de amor como este. Um amor puro que se transmite por um beijo, um doce beijo, tão doce quanto os nossos sorrisos que se rasgam enquanto olhamos um para o outro, quase sem jeito. Não temos tempo para vergonhas, não sei quando te voltarei a ver.

“Beija-me de novo", peço-te.

Respondes ao meu pedido sem que para isso tenha de te explicar fórmulas. Sabes fazê-lo, sabes do que gosto e de como gosto. O teu abraço quente e ao mesmo tempo forte faz-me dançar como uma bailarina. Sinto-me a voar. o meu corpo está tão leve e o vento sopra-me o rosto (…)  Por esta altura, já só oiço as crianças brincarem, o burburinho das pessoas que continuam passeando junto ao mar, e tu já não estás. És tão imprevisível.

“Quando te vejo oura vez", pergunto-te em versão muda…

Em vão, pois, já não obtenho resposta.

Desligo o Itunes, fecho o livro, limpo os meus pés cheios de areia, arrumo as minhas coisas e vou pra casa. . 




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