A Persistência realiza o impossível

segunda-feira, março 20, 2017


@photobyGustavoOtero
Hoje acordei lembrando de todos os pormenores de um sonho, o sonho que tinha ocupado parte da minha noite e do meu momento de pura tranquilidade. Sonhara que dançava num espaço amplo, uma sala cheia de espelhos. O meu sorriso era rasgado e o meu corpo estava incontrolável criando passos de dança que jamais poderiam ser reais no meu corpo. Mas ali, no sonho, eles aconteciam e eram verdadeiros. Parecia um pássaro cuja sua natureza é voar, voar em liberdade. Os meus pés erguiam-se em pontas, os meus braços criavam formas abstratas, e o meu corpo era leve , tão leve que girava sem parar e pela primeira vez ignorava qualquer bloqueio ou boicote da minha mente. Era um corpo livre, saudável e estava feliz. A música entrava-me pelos ouvidos e todos os poros absorviam-na como alimento. Uma vibração dentro de mim era a minha bateria carregada, a minha energia original e consegui reconhecê-la, ainda que por breves instantes ... Depois, a música terminou e todos os bailarinos desfizeram o seu porte e seguiram organizadamente para o fundo da sala como se de uma rotina se tratasse. Fiquei olhando para todos eles enquanto prosseguiam. Eu estava cansada, muito cansada. Afinal o meu corpo havia se movimentado como nunca antes tinha feito. Mas estava bem, completa e a bola de energia que se enchia no meu peito era gigante. Estava cheia. 
De seguida, aquele momento, foi interrompido por uma bailarina. 
"Como vai funcionar a partir de agora? Seremos pagos ao espetáculo?", perguntou ela. 
Ouviu-se um silêncio aterrador quebrado pela intervenção de alguém: 
 " A essa pergunta só a Marlene pode responder"
A minha felicidade transformara-se numa espécie de angústia por não saber que resposta dar. Senti a impotência de procurar desesperadamente uma resposta e nada me vinha à cabeça. Mas respondi. Respondi com sinceridade, a única capaz de responder às questões sem resposta. 
 "Não tenho um cêntimo comigo mas tenho toda a vontade do mundo e acredito que a persistência realiza o impossível"
De repente, do cimo das pontas dos meus pés, senti-me a fazer equilibrismo em cima de uma barra. Não lembro ao certo como terminou o sonho, ou se teve algum final concreto. Acho que ficou em aberto mesmo. 
Hoje é Domingo, dia do Pai, 19 de Março. Acordei feliz por ter dançado a noite inteira mas insegura e sem as respostas para o dia seguinte. Entendi, rapidamente o paralelismo com esta fase de vida pela qual estou a passar. Um fase muito visceral, de grande atividade artística/ criativa e de entrega total a esta aventura (concerteza a mais importante até hoje ao nível profissional), chamada "Reflexo". Começou a ser escrita no interior de um avião entre uma viagem Rio de Janeiro-Lisboa. As imagens foram surgindo à mente em forma de flash e perante isso, o mínimo que poderia fazer por aquela história era criar uma linha de raciocínio para que ela pudesse ser contada. 
E claramente, que a primeira parte do meu sonho referia-se a esta imensidão que está dentro de mim relativamente à vontade de fazer acontecer. No entanto, o fecho do sonho não é mais do que a minha insegurança, o meu ego que (mesmo dormindo) me alerta para as dificuldades e para a consciência de como funciona o mundo dos negócios, o mundo das pessoas crescidas (sinto-me uma criança que começou a caminhar) e a Arte é também ela um negócio comercial, pouco rentável mas um negócio. Lá tomei um café da manhã reforçado. Abri cadernos, a agenda da semana ... ligo ao meu pai ( não posso esquecer: hoje é dia do Pai). O guião está mesmo aqui do lado e cheio de marcações em cor fluorescente. A Brina (a partir do Rio de Janeiro) já está pronta para a nossa reunião em Skype, marcada na noite anterior. Tentámos juntas seguir cada página de texto para entender que músicas são necessárias ela compor (é que um dia decidimos ser ela a fazer toda a composição musical da peça, imaginem a responsabilidade.) E qual a única forma de contacto: Skype e Whatsaap (ela no Rio, eu em Lisboa). 
Ela pegou no Violão e cantou uns esboços. A sua voz é tão mágica que me embalou. Por momentos voltei a dançar em pensamento, tal como no sonho. Conseguimos uma reunião produtiva. Pedi-lhe apenas para termos coisas mais concretas para o dia da reunião de equipa. Sim, o Universo ofereceu-me simplesmente uma grande equipa artística e técnica, de que me orgulho muito e a qual agradeço todos os dias o crédito para com este projeto que só quer homenagear o AMOR, esse protagonista das mais bonitas histórias e de quem jamais me cansarei de falar. 
Whatsaap atualizado com novidades e referências artísticas . Agenda da semana em caos total , dividida entre as necessidades de sobrevivência financeira e as necessidades de criação artística. E qualquer artista saberá do que falo (bem, qualquer um não mas boa parte tenho a certeza que sim). Reservo todas as minhas horas de almoço para reuniões de parcerias. Os parceiros vão surgindo miraculosamente de todos os cantos. Desde a menina do café da frente que ao ouvir-me falar (ao telefone) das dificuldades de financiamento e que me oferece o Catering para os ensaios, ao pessoal do vídeo que se disponibilizaram para tudo o que seja audiovisual, a empresa de comunicação que  quer conhecer a fundo o projeto para saber como ajudar, aos amigos que simplesmente me oferecem trabalho e ideias para conseguir o mínimo de dinheiro para uma peça digna para já não falar da generosidade de toda uma equipa.
Continuo a refletir sobre a sensação que senti ao dançar, ao sentir o meu corpo em movimento, ao sorrir quando cada membro do meu corpo acordava. Senti-me viva! Senti uma força interior, que sei bem de onde vem. Está tudo certo. Estou viva estou aqui e a persistência realiza o impossível. 


 Marlene Barreto

"L'essentiel est invisible pour les yeux"

domingo, fevereiro 12, 2017


@photobyMarleneBarreto
Tenho me deparado  várias vez com a mesma frase: “O essencial é invisível aos olhos” do Saint Exupéry. Acho que todos já a ouviram, leram nem que seja uma vez na vida ( e não estou a generalizar. Quem viu, viu. Quem não viu que a leia ao menos uma vez). Talvez por estar mais suscetível ao invisível, àquilo e a quem não posso ver - mas que posso sentir - esta frase pesa-me toneladas. 
O que é invisível mas que me vale tanto, pergunto-me?
 
Começo um trajeto mental e obsessivo por refletir sobre todos os itens da minha vida (que me lembre) que sejam invisíveis, porém fundamentais. Às vezes chego à conclusão que nunca formalizo uma opinião enquanto não a escrever. É real. Só quando escrevo, entendo que a minha mente entende. Só quando formalizo uma frase, percebo que comecei a conceber uma opinião/ ou uma posição sobre algo. Até lá andamos (eu e a minha mente) no vácuo como duas pessoas que se encontram e dizem: “olá bom dia” e a partir daí cada uma vai à sua vida.
Depois de tanta insistência do Universo, decidi então responder-lhe da forma mais direta e honesta que sei. Vale-me indiscutivelmente muito a clareza da mente. A confusão mental é o primeiro indicador que está na hora de parar e ouvir-me. Quando renuncio a esse apelo, a tendência é o caos instalar-se.  A turbulência do mundo, a perturbação das pessoas tendem a intoxicar-me e eu nem sempre me apercebo. Apenas ganho noção quando perco a noção.
É-me tão importante a Energia que independente da direção que tome só ela me conduz onde é imperativo chegar. A Energia, essa que compõe o meu coração, que percorre o meu corpo e que se instaura no meu cérebro. A Energia que se coloca à disposição da minha sobrevivência física mas que é tão maior. A Energia que repele o que não me faz bem e aproxima quem vibra na mesma frequência. A Energia que me alerta sobre situação que me vai retirar o eixo. A Energia de uma alma que se reflete na minha. A Energia que faz o pôr do sol acontecer, que é responsável pelo desabrochar de uma flor e que faz o vento soprar. A Energia que me faz acreditar que quem não vejo, está comigo todos os dias.
Lembro-me, assim numa fisgada só, do Amor Próprio que se constrói por cima de telhados tantas vezes de vidro e quando estilhaça, o trabalho de o reconstruir é sobrenatural. Faz-se passar desapercebido mas tem a força de um tsunami. Ele ecoa como um grito interno que derruba os falhanços e faz erguer as glórias.
Depois vem -me à mente a Gratidão. Tão invisível. Eu sinto-a como se fosse uma espécie de bolha de ar que incha dentro do peito. A gratidão por coisas tão simples como ter do que me “alimentar”. Que pena tenho eu daqueles que não vêem alimento em nada. Assim se perde o sentido de uma vida.
É também invisível o prazer de Vibrar com o que mais gosto de fazer. Ir diariamente para o trabalho policiando os ponteiros do relógio é tão grave ao ponto de questionar o que quero eu fazer com a Vida? A Vida, que preciosidade essa.
De todos itens de invisibilidade declaro o Amor, (o meu amor) a minha emoção mais essencial. O amor, aquele que é meu e é o responsável pelas minhas maiores loucuras, aquele que define as minhas prioridades, que me faz situar interiormente enquanto simultâneamente rouba a minha percepção de tempo e espaço. O amor que é tão singular a cada um, que tem uma identidade tão própria. O amor, esse artista dos artistas, o poeta dos corações… aquele que desorganiza o jogo, chacoalha o coração, faz brilhar o olhar e cria os alicerces básicos para a minha sobrevivência. O meu amor, aquele que é só meu. Preciso do amor assim como qualquer texto precisa da vírgula para respirar , como a lâmpada precisa da luz para acender, como a canção precisa de alguém que a cante. Preciso do meu Amor que é agora invisível mas que dentro de mim está em união total com a minha alma. 



PS: Odeio-te!

domingo, fevereiro 05, 2017

 

@photobyMarleneBarreto


Chegas de mansinho, sem que ninguém dê por ti… sem que ninguém se aperceba da tua chegada. 
És dissimulado. Tens o poder de colocar um mundo inteiro num alvoroço sem que ninguém te consiga fazer frente. Cobarde descarado. Não consegues ter a coragem de olhar de frente, mostrar um único rosto… preferes esconder-te atrás de múltiplas caras… Não vales nada!
Consegues com muita perícia roubar tudo: a tranquilidade a normalidade de um dia-a-dia.  a esperança de um futuro. a felicidade de uma vida. até que por fim fazes o cheque-mate!
Onde está o teu rosto?  Não está, pois não?  És um merdas. Só queres protagonismo. Que falem da tua existência. Uma luta justa e honesta não te interessa, pois não? Era de te dar uma bofetada nessa cara e partir-te ao meio.
Tenho a certeza que um dia, se fará uma festa. Uma enorme festa porque alguém finalmente te conseguiu fazer frente. E nesse dia, estarei na primeira fila de festejos. Todos irão dançar e cantar …  na vez daqueles que derrotaste com a tua maldade.
Desaparece filho da puta. Morre! 
O sofrimento que já provocaste a quem amo, não tem perdão…
Tu nunca saberás o que é o Amor. 
Cancro, tumor maligno, neoplasia … são apenas palavras…. és muito mais vil do que aquilo que te chamam. 
Quem luta contra ti, luta com o rosto, com a alma, com a vida… É injusto que não dês a cara…. que não aceites lutar em pé de igualdade ! 
Sem cumprimentos 

PS: Odeio-te!

Marlene Barreto

(CARTA AO CANCRO, escrita dia 2 de Maio de 2015 mas que serve bem para assinalar o meu dia contra o cancro).  



AMOR, TEMPO, MORTE: treino básico para a vida... o resto é "peanuts"

terça-feira, janeiro 24, 2017

@photobyMarleneBarreto

Sou da opinião que o Ministério da Educação deveria inserir como obrigatória na escola, a disciplina : “Treino básico para a vida". E não, não estou a falar em esoterismo e ou espiritualidade … mas naquilo que o próprio nome da disciplina incita. Dar ao ser humano, um treino básico, as premissas mais importantes para Viver e não sobreviver. Sejamos sinceros, Viver tem tanto de mágico quanto de difícil, e eu sou pessoa otimista.

Na minha opinião focar-se-ia em determinados conceitos que tantas vezes subvalorizamos. E há muito que me apetece falar sobre a matéria que poderia ser lecionada nesta disciplina e talvez não o fizesse agora, se não se tivesse ligado o meu motor ao ver o filme “Beleza Colateral” com o Will Smith. O que me faz escrever este texto debruça-se sobre aquele que é o maior objetivo da arte: pôr-nos a refletir, mexer com o interior, bagunçar e chacoalhar as emoções. Este conceito de Beleza Colateral na Morte deixou-me a pensar, a pensar demais. E sim, acreditem que mexeu comigo acima da linha. Foi impossível assistir ao filme de ânimo leve e deitou abaixo toda a boa disposição que tinha angariado durante toda a semana. Nessa noite, a minha voz calou-se por completo e o meu cérebro começou a batalha pela dissecação dos conceitos: Amor, Tempo e Morte e inevitavelmente procurar a sua Beleza Colateral. Que beleza será esta?


Como atribuir valor a um conceito tão imensurável como é o teu, AMOR? 

Tantas vezes incompreendido, criticado e alvo dos maiores ataques terroristas e mesmo assim colocas-te ao dispor sem retorquir uma palavra. Admiro a tua coragem em tentares tanto, em resistires aos maiores resistentes, em promoveres tanto crescimento emocional e em troca levares com tantas negas. Como teimas tantas vezes promover a harmonia a troco de 0? Não te cansas de ser tão … ignorado? Confesso que no teu caso eu já teria feito as malas e partido para outra…
Quantas vezes já andaram às turras contigo por deferenderem que só TU tens deveres? Quantas vezes já foste tema de conversa entre amigos e ou casais? (Não te rias, foi só uma pergunta retórica). Lembraste da quantidade de vezes que foste a desculpa para fundamentalismos e tiranias? Quantas vezes escritores já te usaram procurando ser best sellers ou que já deste o nome a poemas sofridos do poeta que não consegue ser visível aos olhos da sua amada? 
Todos te usam e nem sequer direitos pedem. .
Ainda bem que a Perseverança é uma das tuas maiores características. Se te serve de consolo, eu não viveria sem ti. Deste-me as melhores sensações do mundo e se tivesse de morrer amanhã, morreria feliz. Até poderia tentar dizer que trazes contigo as emoções mais verdadeiras e reais que um ser humano pode sentir, dizer-te que perante a tua presença o meu coração passa a ter uma amplitude infinita e que só tu me fazes sentir Humana. Contigo trazes o cuidado imensurável, os afetos descarados e sem pudores, trazes o beijo verdadeiro, a necessidade de perdoar, a arte de OUTRAR.
Sou tão leiga para falar de ti que sinto que estou apenas em estágio . Já me fizeste sofrer, não vou negar mas acredito que todo esse sofrimento teve uma “Beleza Colateral”. Já fiquei “de mal” com alguém antes de ir dormir e é das piores sensações do mundo. Prometi a mesma não voltar a repetir porque o tempo passa e nós desconhecemos o conteúdo do contrato que assinámos no entre-vidas.

TEMPO, para que serves se não passas de uma concretização do homem para controlar a abstração de que és feito? 

“Tenho todo o tempo de mundo” canta Rui Veloso. Afinal o que és tu, se não uma tentativa humana de exercer poder sobre algo? Quem disse que o dia tem de ter 24 horas, ou que temos de viver entre as 12h e as 00h . Afinal de que és feito que não de uma matéria invisível que apenas se nota através das rugas que vão carregando a nossa pele? Gostava de te conhecer tanto quanto ao Amor, mas tu és mais esquivo, foges-me por entre os dedos e praticamente não conseguimos ter uma conversa de adultos, olhos nos olhos. Às vezes imagino-te como aquelas crianças traquinas que teimam em sair da vista dos adultos sem aviso prévio. Uma pessoa distrai-se e lá foste tu. Tal como o teu colega anterior, acho que são poucos ou nenhuns os que te compreendem. Talvez Einstein tivesse esboçado uma teoria um pouco mais ampla sobre ti, mas  a partir daí pouco mais se sabe. Fala-se que és uma espécie de quarta dimensão e os realistas defendem que és separado da mente humana. Depois há quem fale de ti usando os conceitos de passado, presente e futuro e existe ainda quem se dirija a ti como irreal ou seja que não existes e que o ser humano é que tem a ilusão do tempo. Fico confusa, não te entendo. Sinto-te no meu corpo, no meu rosto, na minha alma…mas nem sequer te posso acusar porque não sei se és real … Para os humanos traduzes-te em “Envelhecimento": desgaste natural das células ao longo do tempo. Mas se tu não existes como denomino eu a passagem que existe entre o meu nascimento e a minha morte? Uma espécie de vácuo? Sinceramente, gostava que jogasses um pouco mais limpo e te fizesses entender … mas o mais certo é que gostes de ser aquele personagem que só aparece no momento final do filme, mostrando que foi ele que proporcionou todo o enredo. Aceito mas não compreendo, mas talvez a humanidade não passe de um filme da quarta dimensão ….

E que Beleza Colateral existe em ti, minha Morte?

Dirijo-me a ti com algum carinho só para quebrar o gelo entre nós. Porque tu, sim és gélida, tão gélida quanto o mármore. Tens mais protestantes que admiradores e para saber disso não preciso de recorrer ao google. Tu e o tempo devem ser amigos, parece-me. Vejo-te assim como uma espécie de desfecho do mesmo e corrige-me se tiver errada. 
 A nossa conversa é de igual para igual e sem grande pompa e circunstância. Somos adultas e não me assustas, propriamente.  Aceito que existas, só me é difícil o teu jeito e ar calado…desculpa que te diga, mas não te sinto propriamente fiel a nada nem a ninguém, a não ser a ti própria. Sempre que me vens à mente, não sei o que pensar… serás tu um mal necessário, ou um bem inevitável? Pois depende da perspetiva, se formos apenas uma peça do jogo, então não vejo a Beleza Colateral em sermos derrubados sem dó nem piedade, muitas vezes numa só jogada. Vou dizer-te na cara e não é que não saibas, mas tu não tens amigos porque não és dócil, és fiteira, chantagista, irónica e em muitos casos fazes questão de ser impulsiva sem dar tempo para as despedidas. Se tenho de aceitar? Tenho, que remédio mas não sejas ruim, caramba. Ok, também concordo que a solução não seria ter uma morte com data marcada mas ainda assim acho que as regras deste jogo deveriam ser revistas.
E já agora que Beleza Colateral é esta que tens? O que pode ter de belo, assistir a um coração deixar de bater? Como pode ser belo o sofrimento?
Acho que por hoje não quero mais conversas contigo, fiquemos por aqui . Talvez num próximo dia consiga estar à altura de responder ao teu silêncio ensurdecedor.

Amor, Tempo e Morte … a trilogia base da disciplina “Treino básico para a vida”, o resto é “peanuts". 

Marlene Barreto

PS: Convido todos a ir ver o filme e não, não ganho nada em troca, apenas as vossas reflexões se as quiserem aqui partilhar.  





Abraça-me mais forte ainda

quinta-feira, janeiro 19, 2017

@photobyMarleneBarreto
Enquanto dormes na cama depois de já termos feito amor, apetece-me simplesmente contemplar-te. Percebo-te exausto depois de um dia de trabalho que certamente foi exigente. Mas agora dormes, dormes como um pequenino indefeso que apenas quis chegar ao seu ninho seguro. E estás nesse lugar, sem que ninguém te possa fazer mal. Passo-te a mão pelo rosto só para te sentir e tu, percebendo a minha presença, sorris, puxas-me para perto de ti e abraças-me forte. Fazes com que não exista qualquer distância entre nós. O teu abraço é tão forte que prende qualquer movimento que eu tente. Não consigo fugir. Mas também não quero. Não tenho para onde ir que não seja ficar aqui ao teu lado. Desejo viver em slow motion este momento para saborear em câmara lenta esta troca constante. Trocamos o calor dos nossos corpos nus, a respiração que suspira pelo mesmo, partilhamos carinhos e sonhos de uma vida cheia de sentido.
Estou de costas para ti, sabes que é dessa forma que gosto de ser abraçada enquanto dormimos. Mas pelos vistos já não tens sono. Estás desperto. Bem desperto, sinto-o. Pedes-me para me virar e olhar-te nos olhos. Olho-te com todo o meu amor. Neste momento, não os vejo, mas avaliando os teus, os meus olhos sorriem e dizem o quanto estou feliz por estar aqui.

 “Abraça-me mais forte ainda”, peço.

 E tu não hesitas. Inalo o teu cheiro como sendo a minha droga, a droga que me deturpa os sentidos do onde, do quando e do porquê.
Estás inquieto, eu estou inquieta … estamos prestes a fazer amor outra vez. As nossas almas transcendem e à medida que sinto o teu coração pulsar e o teu corpo suado de prazer, fico ainda mais excitada. Não consigo controlar e as lágrimas caem-me no rosto, são de felicidade.

”Não te preocupes, está tudo bem comigo, continua”, digo.

Sinto-me em unidade contigo e isso é esmagador.

“Abraça-me mais forte ainda se conseguires”, volto a pedir.

Tu tentas mas já não há intensidade física suficiente para a energia que os nossos corpos emanam. É místico, é mágico… Os teus olhos espelham-se nos meus. Toda a intensidade do momento exauriu-nos e por agora, só nos resta relaxar um pouco.
Levantas-te ainda nu e eu observo-te. Procuras atrás da moldura, que tem a nossa fotografia da Turquia, e pegas na garrafa de Whisky. Enquanto o líquido cai no copo, adoro a forma como intercalas o olhar entre mim e o que estás a fazer. O teu sorriso está rasgado. Estás feliz, eu sei.
Deitas-te ao meu lado e, juntos, nús, olhamos o teto. Temos um candeeiro enorme na frente ainda que o teto tivesse algum interesse.

“Somos parte um do outro, sabes disso?!”, oiço-te.

 Senti de imediato um arrepio vindo da lombar até ao pescoço.

“Bem sei”, respondo-te.

 Olhas para mim , sorris mais uma vez e interlaças o teu braço ao meu pescoço. A excitação passou, o orgasmo aconteceu mas o amor dilata-se neste quarto que se torna tão pequeno para nós. 


Ali.

Tic, tac, tic, tac... e amanhã pode já não ser amanhã.

domingo, janeiro 15, 2017

@photobyMarleneBarreto
Levantar, vestir, lavar o rosto, os dentes, acordar a criança, dar-lhe de comer, vesti-la, vestir-te, abrir a porta, fechá-la, entrar na empresa, dar os bons dias, sentar, colocar os phones, trabalhar… o relógio marca horário de almoço… almoças e voltas para trabalhar mais um pouco. O telefone não pára de tocar . As encomendas chegam, novos pedidos precisam de ser feitos. Os dedos teclam freneticamente no teclado do computador enviando e-mails, e muitas vezes as respostas não chegam. Antigamente, com uma conversa tudo se resolvia, hoje em dia sem um e-mail, nada acontece.
Um tempo para o teu cigarro e café, tens? Claro que sim, estás deserta. Então vai lá.
Esboças um sorriso à colega do lado que está na sala de fumadores ao mesmo tempo que tu. Não se conhecem mas já se cruzaram algumas vezes. Trocam meia dúzia de palavras (assim tudo pela superficialidade) e sobes até ao escritório para continuar o que estavas a fazer antes da pausa. E assim se passam horas até bater o ponteiro no horário de ir para casa.

“Que felicidade”, dizes para ti própria em forma de pensamento. 

O teu momento mais feliz do dia é o do arrumar a secretária, desligar o computador e dizer “até amanhã”.
Mas espera... antes de ires para casa, tens ainda o teu filho para ir buscar à escola. Sinto muito dizer-te mas ele teve tão entretido o dia todo, que nem deu pela tua falta. Falas-lhe que antes de chegar a casa, terão de passar no supermercado e ele, simplesmente, concorda e apressa-se a pedir-te um presente. Sempre que te sentes culpada pela tua ausência não hesitas e dizes-lhe que “sim”, mas hoje não era o dia … estavas frustrada: 

“Só se te portares bem”, disseste-lhe.

Deixa-me que te questione: O que significa o teu filho portar-se bem?
 
Será não fazer uma birra de criança? Não espalhar todos os brinquedos pelo quarto como fazem todas as crianças? Não passar horas a fio atrás de ti chamando: "Mamã, Mamã …"
 
Achas que consegues ser mais exata na tua explicação?

Vens cheia de sacos e ele é pequeno demais, não te consegue ajudar. Nisto, o teu marido saíu mais cedo do trabalho e chegou a casa primeiro.

“Poderias ter começado a fazer o jantar”, pensas mas não lhe dizes.

Dás-lhe um beijo morno (e atenção que morno é aquela temperatura tépida  e esquisita que nem se sente nem deixa de se sentir) e vais para a cozinha. Ele entende a tua estranheza mas não te quer encher com perguntas e toma que é o cansaço a apoderar-se de ti.
Falta o jantar e o banho do teu filho. E enquanto deixas a comida ao lume ( assim como quem tem um olho no burro e outro no cigano), colocas o be na banheira e pedes ao teu marido, gentilmente, para que ponha a mesa.

“Sim, claro”, respondeu-te de imediato.

Tu já terminaste a tua tarefa e e ele ainda está a finalizar a dele. Não falas mas quem te conhece bem sabe o que estás a pensar:

“Como é que eu já fiz milhares de coisas e peço-lhe para pôr a mesa e ele ainda nem conseguiu chegar ao fim?!”…

Vê-se pela tua cara que isso te faz confusão, sentes-te injustiçada e o teu sentimento roça a vitimizaçao e em nada encontras o lado positivo. Pior do que tudo, é permaneceres calada.
Enfim, sentam-se para jantar e aproveitam para falar:

“Como correu o teu dia, amor? ”, perguntou ele.

“Oh igual a todos os outros” respondeste enquanto repreendias o menino que estava a fazer a maior badalhoquice com a sopa.

Depois mudam a temática. O vosso filho tem de ir ao pediatra e tu não sabes se vais conseguir despachar-te a tempo . Está a aproximar-se a reunião de apresentação de contas e tu andas a mil lá na empresa.

“Poderias ir com o menino à consulta? É que vai ser difícil libertar-me a horas por causa do fecho de contas”.

“Claro que posso, quando  é ?” respondeu-te prontamente. 

E a tua cabeça começa logo a trabalhar que talvez ele se esqueça de falar da febre que o menino teve na semana passada, das borbulhinhas que lhe têm aparecido no corpo de vez em quando … enfim, descartas logo a hipótese do teu marido o levar ao pediatra. Como sempre, Tu vais conseguir.
Depois, enquanto ele levantava a mesa, punha a loiça na máquina e dava uma varredela rápida ao chão da cozinha, tu foste ao telemóvel para ver se tinha chegado um zap ou um e-mail da empresa. Nada demais, tudo tranquilo. De seguida, vais deitar o be e rezas para que ele tenha uma noite descansada, aliás isso é mais uma questão a referir no pediatra… ele não dorme bem e tu estás a enlouquecer.
São 22h30 e finalmente, sentas-te no sofá. 

“Ufa!!!! Estou estafada”, disseste

“Enrosca-te a mim, amor”; pediu o teu marido. 

Puxas a manta preta que está exemplarmente dobrada na chez longue e tapas-te recostada a ele. Assim que te recostas é literal, cais para o lado. Ainda sentes o seu beijo e ele dizer-te ao ouvido:

 “Sabes que te amo, não sabes?” … 

Mas a voz já está tão ao longe que a força de responder já não existe. A tua energia foi sugada e deixas-te dormir que nem pedra.
E se antes foste tu a levar o teu filho para dormir, agora é o teu marido que te transporta ao colo até à vossa cama, para evitar que acordes a meio da noite deitada no sofá e com dores nas costas. O despertador está automático e amanhã vai tocar à hora de sempre  para mais um dia igual a todos os outros.

No meio disto tudo, faço -te 2 perguntas:
Tu existes?
Achas mesmo que é no piloto automático que está o verbo Viver?

Por acaso, reparaste que o teu marido colocou o CD da Narah Jones ao jantar? Suponho que não, estavas demasiadamente preocupada com a tua vitimização. Percebeste que o teu filho te disse que gostava de ti antes de dormir? Apenas não reparaste porque estavas focada em ser tão perfeita que só lhe querias ler a história do menino Mogli até ao final. Viste que  a tua amiga te mandou um vídeo super inspirador : “ Reinvent your Life - Charles Bukowski”? Claro que não, estavas a sofrer por antecipação com o grupo de trabalho do WhatsApp.   
Foi mais um dia e tu nada viveste, e desta forma se faz mais um risco no calendário da vida.
O relógio nunca pára … tic, tac, ti, tac e amanhã pode já não ser amanhã e podes já não conseguir ouvir o despertador que continua no automático.
Ouve o silêncio mesmo quando ele não tem nada para dizer. São esses os momentos em que a alma sussurra e te mostra o caminho que tens de seguir. 
Aconselho vivamente a viver esta experiência de forma acordada. 



                                                                                                       . 

Beija-me. Meus lábios secaram.

terça-feira, janeiro 10, 2017


 
@photobyMarleneBarreto

Os meu pés acariciavam a areia húmida e fria, faziam uma espécie de movimento circular repetido. Rodavam ora mais lentamente, ora com um ritmo mais acelerado como se personificassem a linha da minha impaciência.
Olho à minha volta e vejo vários casais de mãos dadas que passeiam à beira-mar, o que faz com que os meus lábios risquem um sorriso.

“Sobre o que falarão eles?”, interrogo-me.
Um dos casais gesticula muito como se estivesse a resolver algo entre eles… o ser humano está sempre resolvendo coisas.
Lá ao longe vejo um pai tentando ajudar a filha (parece-me uma menina) a molhar as suas mãos no mar. Está com medo das ondas e como adulto que protege a sua cria, o pai garante que nada de mal lhe acontece. 


"Que lindo está o mar! Tem aquela cor de prata que tanto gostas", penso.

 “ Porque não vens ver?! Vais gostar.”, continuo.

O seu brilho ofusca-me quando tento olhar para a linha do horizonte.
Não sei se vens. És imprevisível, tanto quanto o mar que por vezes ondula calmo, como outras leva tudo à frente. Espero que a tua imprevisibilidade se decida pelo “sim”. É certo que não temos encontro marcado, não existe hora combinada nem tão pouco te falei do local… enfim, sem compromissos. Tu também nunca foste de te comprometer. Vem, apenas se quiseres. (Mas quero muito que venhas).
O meu sossego é invadido pela excitação de um cachorro que se atira a mim, enchendo-me de areia. Está tão alegre que o abraço, como forma de lhe agradecer o carinho. Os cães têm algo em comum com os humanos, acalmam-se com uma demonstração de carinho e afeto com a diferença que eles não têm dificuldade em admiti-lo, já o ser humano sente na fragilidade e na sensibilidade a sua “ zona não confortável”.

“Beija-me. Meus lábios secaram. Estou à tua espera, entendes isso?”

O beijo vai aproximar-nos, jamais nos afastará. O beijo embora nos torne frágeis, injeta-nos segurança.
O que mais gosto não é do beijo mas do ato de beijar. Das sequências algébricas do corpo até ao momento do beijo. Beijar é um ritual que vai do toque das mão que se acariciam à união dos lábios. As mãos sobem ao rosto com ternura e sentem cada linha da face. Os dedos sublinham os olhos fechados, delineiam o nariz, pressionam as maçãs do rosto e tocam de leve nos lábios, primeiro o inferior depois, o superior. Os olhos abrem e sorriem como se se espelhassem. Os lábios ainda nem se tocaram e o corpo já viveu uma viagem. Com um leve sorriso no rosto, o seu encostar é ávido de desejo, de ternura, de saudade. As bocas trabalham na rotação certa, as línguas encontram-se como almas e as mãos acompanham a equação.
E é desta forma que o meu raciocínio sobre a arte de beijar é interrompindo por alguém que me tapa os olhos .

“Não precisas de falar , conheço-te o cheiro, já de outras vidas”, digo sorrindo. 

 Abraças-me forte e sentaste-te ao meu lado a contemplar o mar.

“Tem a cor da prata”, dizes-me

“Sim, tal como gostas”. confirmei.

A tua mão foi chegando-se à minha meio envergonhada. Sinto um arrepio e encosto o meu rosto no teu ombro.

“Como sabias que estava aqui?”, perguntei.

“Recebi a tua mensagem”, disseste.

“Pensei que Ele não ta desse”, disse. 

“Com a intensidade da tua alma, ELE jamais impediria este encontro".

E assim ficámos por horas a contemplar-nos, recriando o momento mais perfeito da eternidade. Beijaste-me com todo o ritual , com todas as formas geométricas exigidas num momento de amor como este. Um amor puro que se transmite por um beijo, um doce beijo, tão doce quanto os nossos sorrisos que se rasgam enquanto olhamos um para o outro, quase sem jeito. Não temos tempo para vergonhas, não sei quando te voltarei a ver.

“Beija-me de novo", peço-te.

Respondes ao meu pedido sem que para isso tenha de te explicar fórmulas. Sabes fazê-lo, sabes do que gosto e de como gosto. O teu abraço quente e ao mesmo tempo forte faz-me dançar como uma bailarina. Sinto-me a voar. o meu corpo está tão leve e o vento sopra-me o rosto (…)  Por esta altura, já só oiço as crianças brincarem, o burburinho das pessoas que continuam passeando junto ao mar, e tu já não estás. És tão imprevisível.

“Quando te vejo oura vez", pergunto-te em versão muda…

Em vão, pois, já não obtenho resposta.

Desligo o Itunes, fecho o livro, limpo os meus pés cheios de areia, arrumo as minhas coisas e vou pra casa. . 




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